Dengue neurológica rara deixa jovem tetraplégica e em coma.
Atualmente com 19 anos, a jovem está cursando nutrição mesmo com todas as limitações. Ela teve dengue neurológica e não enxerga nem se mover
Em tempos de epidemia de dengue, um dos quadros mais temidos é a versão hemorrágica da condição. Porém, em casos raros, a doença pode causar problemas neurológicos graves.
“Quando vejo como ela era e como ficou, me dou conta de que a vida é frágil”, conta a enfermeira Elizângela Matias. Sua filha, Polyana Matias, teve dengue aos 15 anos — porém, o quadro se agravou e ela ficou sete meses em coma. Hoje, aos 19, a jovem é tetraplégica e não enxerga por conta da doença.
Em 2019, a mineira de Divinópolis morava em Belo Horizonte quando começou a sentir os primeiros sintomas da dengue: febre, dor de cabeça e no corpo. Uma semana depois, porém, Poly piorou e teve crises convulsivas e vômitos que a obrigaram a ser internada com urgência.
Inicialmente, os médicos acharam que os sintomas eram causados por dois quadros em separado. Para evitar as convulsões, ela foi colocada em coma induzido — porém, uma biópsia de líquido espinhal revelou que a encefalite grave era de fato uma consequência da dengue.
Dengue neurológica
Poly teve a chamada dengue neurológica, uma forma rara da doença em que o vírus invade o sistema nervoso, causando inflamações cerebrais. Um estudo publicado em 2005 reuniu 41 casos suspeitos da condição registrados entre 1997 e 2002 em um hospital especializado, e apenas três se confirmaram.
“Os médicos falaram várias vezes que minha filha não voltaria, que seria melhor desligar os aparelhos, já que as lesões cerebrais por conta do vírus eram incompatíveis com a vida”, lembra Elizangela.
Após sete meses de coma, Poly acordou. “Foi uma sensação maravilhosa, senti uma gratidão imensa ao ver que ela estava acordada e responsiva. Até hoje tem gente que fala que minha filha é um vegetal, mas conseguimos entendê-la e ajudá-la”, conta.
A vida pós-coma
A dengue neurológica, porém, deixou graves consequências no corpo da jovem. Com muita fisioterapia, ela conseguiu voltar a se sentar e a família criou um código de comunicação: eles falam cada letra do alfabeto e Poly reage com movimentos de cabeça para formar as palavras que ela quer dizer.
Ainda assim, a mineira não consegue mover os membros, se alimentar, respirar sem aparelhos ou mesmo sustentar a própria cabeça. Ela não tem visão por conta das lesões no nervo óptico e usa fraldas diariamente. Por causa dos cuidados necessários para mantê-la em casa, Elizângela precisou deixar o emprego e se dedicar exclusivamente à filha.
“Sou enfermeira. Lutei minha vida toda para estudar, fui a primeira pessoa da minha família a fazer faculdade. Hoje em dia, entendo que era Deus me preparando para cuidar da minha filha, para estar com a Poly quando ela precisasse”, afirma.
Busca de autonomia
Poly luta para ter autonomia apesar das dificuldades. A primeira pergunta que ela fez quando acordou do coma foi: “Há quanto tempo que estou fora da escola?”. Mesmo com as limitações, ela não parou de estudar e teve apoio da escola, que adaptou as aulas para que a jovem pudesse se formar no ensino médio.
Poly fez o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) em 2022, e a prova foi adaptada com monitores leitores e transcritores. Com o apoio, ela conseguiu bolsa em uma faculdade particular e, hoje, cursa nutrição.
“Muita gente fala que ela não devia estar estudando, mas respeitamos as vontades dela. Poly escolheu o curso que queria fazer e tem se dedicado a isso. Minha filha tem muita vontade de viver e quer levar a vida adiante, como nós também queremos”, conta a mãe.
A família ainda espera que Poly recupere mais de sua autonomia. Elizângela tenta arrecadar dinheiro para levar a jovem à Tailândia, onde existe um tratamento experimental com células-tronco que pode permitir à jovem voltar a enxergar. Apenas a viagem, com a respiração mecânica, custaria cerca de R$ 1 milhão.
Um sonho mais próximo é que a jovem receba a vacina contra a dengue. Se Poly voltar a se infectar, pode enfrentar consequências ainda mais graves. Porém, ela não faz parte do grupo prioritário para receber doses pelo Sistema Único de Saúde (SUS).