Jovem Pan usa plataforma de plágio com nome de Samy Dana para copiar reportagens de outros sites

O Grupo Jovem Pan, composto por rádio, televisão e portal de notícias, tem usado um programa de inteligência artificial para plagiar conteúdo de outros veículos de forma velada, postando no próprio site o material como se tivesse sido produzido por eles, sem dar os devidos créditos aos verdadeiros autores.

A plataforma de plágio leva o nome de “Samy News” e, dentro da própria empresa, segundo ex-funcionários, é atribuída ao economista e professor Samy Dana, um dos principais comentaristas do grupo.

Esta denúncia chegou ao Intercept Brasil por meio de profissionais que até recentemente atuavam na empresa, demitidos em um acelerado processo de esvaziamento que a Jovem Pan vem sofrendo desde o ano passado.

Na primeira quarta-feira do ano, 3 de janeiro, a Jovem Pan cortou quatro repórteres dos 11 jornalistas que restavam em sua redação. Responsáveis por alimentar cinco editorias, eles produziam matérias para o site e haviam trabalhado em esquema de plantão durante o fim do ano. Em 2023, ao todo, 18 jornalistas atuavam no portal de notícias do grupo.

As seguidas demissões, de acordo com os profissionais, têm relação direta com o uso posterior de um programa para copiar notícias de outros portais. Com o trabalho feito por IA, uma das atribuições dos jornalistas passou a ser de checar as cópias, em uma tentativa de despistar o plágio antes das matérias serem publicadas.

Inflada durante o governo Bolsonaro, a Jovem Pan viu as verbas públicas de publicidade decaírem de forma vertiginosa a partir da posse de Lula – despencaram do 12º maior faturamento entre veículos de mídia até atingir números irrisórios, a partir de 2023.

A emissora também perdeu, conforme publicado no Intercept, importantes cotas de publicidade privada, após o grupo Sleeping Giants Brasil questionar grandes empresas por patrocinarem quem fomentava discurso de ódio, ataque às urnas eletrônicas, além de informações falsas sobre a vacina da covid-19.

Com problemas de fluxo de caixa, a Jovem Pan apostou, então, na redução da equipe. Para manter o site em funcionamento – inclusive em áreas do portal nas quais cobra do leitor um valor para o acesso às notícias – passou a usar uma plataforma que copia postagens em velocidade industrial, segundo afirmam os ex-funcionários ouvidos pela reportagem.

Um levantamento feito pelo Intercept mostra que, atualmente, 66% do material produzido pela Jovem Pan é feito por inteligência artificial, copiando textos de outros portais – entre eles, G1, Folha, CNN, Estadão, Valor Econômico e UOL.

Plataforma de plágio da Jovem Pan leva o nome de Samy Dana

O programa Samy News, contaram os ex-funcionários, mapeia matérias de outros veículos, altera o texto e disponibiliza para publicação conteúdos em diversas editorias, como economia, política e entretenimento.

Os profissionais ouvidos não souberam explicar como o comentarista teria implantado a plataforma no dia-a-dia da redação, mas disseram que a mudança partiu dele – e que seu papel, extraoficialmente, é muito mais representativo nas decisões editoriais, indo além da função de um comentarista econômico que se comunica com o público.

Ao ser implementada, a ferramenta funcionava como uma plataforma paralela. Mas, no fim do ano passado, foi anexada diretamente ao publicador no qual os jornalistas da Jovem Pan editam as matérias antes de publicá-las.

Perguntamos ao Samy Dana se ele tem participação no Samy News ou em outra ferramenta de inteligência artificial usada pelo Grupo Jovem Pan. A assessoria do economista alegou que está de férias no exterior e, por isso, não responderia. Insistimos no pedido e recebemos a resposta que alguém da equipe jurídica de Dana entraria em contato com o Intercept – o que, de fato, não aconteceu.

A Jovem Pan também foi procurada, mas não respondeu aos nossos questionamentos. Depois da reportagem publicada, o advogado da emissora entrou em contato com o Intercept e disse que o veículo “vem desenvolvendo e incorporando, em toda sua atividade, inclusive em sua redação, sistemas de inteligência artificial”.

Disse também que as soluções incorporadas “são utilizadas para auxiliar a atividade dos jornalistas na produção de suas notícias”, mas que isso “jamais pode ser interpretado como plágio”. Samy Dana não foi citado na nota enviada pela Jovem Pan ao Intercept.

Antes de ser anexada ao publicador, dizem os ex-funcionários, a ferramenta era acessada diretamente, a partir de uma URL. Tivemos acesso a esse endereço, que parece ter sido feito especificamente para a Jovem Pan. A ferramenta lembra a página inicial de um site de notícias, mas sem nome ou identidade visual.

Na parte de cima da página inicial, está escrito apenas “news”. No rodapé, a assinatura: “SamyNews © 2023 – Todos os direitos reservados”. Ironicamente, o site traz no rodapé o símbolo de copyright, que protege justamente o direito autoral e a propriedade intelectual dos conteúdos.

Buscamos por “SamyNews” em agregadores de informações de CNPJ, no buscador da Receita Federal, na seção de empresas e negócios da plataforma do governo federal e no site da Junta Comercial do Estado de São Paulo, onde as demais empresas de Samy Dana estão registradas. Nada foi encontrado.

O domínio utilizado pela plataforma também não dá dicas: não há nenhuma informação pública sobre o responsável pelo endereço newsjp.mdsai.com.br.

O endereço mdsai.com.br, por sua vez, é registrado por Luiz Fernando Simões Favaro, cientista de dados da Semantix – uma empresa que vende serviços de inteligência artificial e que, em 2022, contratou Samy Dana para uma palestra.

Contatamos Favaro pelo telefone e e-mail registrados na Receita Federal, mas não tivemos retorno. Depois da reportagem publicada, Favaro entrou em contato e afirmou que desenvolveu, sim, a plataforma a pedido de Samy Dana, como prestação de serviços da empresa de Dana com Adonay de Nuccio, seu sócio. Ele nega, porém, que seja uma plataforma de plágio.

Também depois da reportagem ir ao ar, a empresa de inteligência artificial Semantix entrou em contato com o Intercept para afirmar que, apesar de Luiz Fernando Simões Favaro ser seu funcionário, a companhia não tem nenhuma relação com a plataforma “Samy News”.

Havíamos perguntado a Samy Dana qual era sua relação com Favaro, mas ele não nos respondeu.

Samy Dana e sócio defenderam IA no lugar de jornalistas

nova função dos repórteres da Jovem Pan virou precisamente o que Adonay de Nuccio, sócio de Samy Dana na PrimeTalk, uma empresa de produção, disse que o ChatGPT iria “atropelar”.

Em um vídeo publicado no Instagram em fevereiro de 2023, o jornalista disse que 70% do jornalismo seria substituído por inteligência artificial, porque grande parte do trabalho é pegar uma mesma informação e escrever sobre ela de maneira diferente.

Para ele, já existe inteligência artificial que faz isso e “que não reclama de cansaço, que trabalha de madrugada, que não pede VR [Vale Refeição]”.

“Nem direito trabalhista”, complementou logo em seguida, com um sorriso no rosto, o próprio Samy Dana, então parceiro de bancada de Adonay de Nuccio no “Talk InvestNews”, um podcast do portal de notícias InvestNews.

Samy e Adonay são sócios desde 2017. O registro da empresa deles na Receita Federal lista, entre as atividades que podem ser exercidas, a de “portais, provedores de conteúdo e outros serviços de informação na internet”, uma categoria que permite “operar e gerir websites, ou mesmo a operação de ferramentas de busca”.

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